terça-feira, 22 de janeiro de 2019

Deputados, China e Tecnologia – um artigo de Stephanie Hansson


O artigo de hoje é a excelente análise de uma amiga, Stephanie Hansson, que autorizou sua publicação na Revista Opinião. Segue o mesmo abaixo:

Vamos falar um pouco da polêmica sobre a ida dos Deputados do PSL a China e, também, colocar algumas observações pessoais sobre certas “perspectivas”: comecemos pelo fácil e óbvio: A viagem foi um desastre total.


Primeiro que foi uma “caipiragem” mesmo a nível diplomático, tantas as quebras de protocolos básicos que nem vou começar a citar. Nem o Bolsonaro estava ciente... Paro por ai.

Segundo, a nível de PR (relações públicas), um desgaste desnecessário a todos os envolvidos, críticos e participantes. Cada um alegando ignorância por parte do outro lado, e temo que ambos tenham razão até certo ponto. Enfim, uma divisão da Direita que não precisávamos no momento.
Não deviam ter ido, ponto final. Não há dúvidas sobre isso.

E digo isso não só por motivos ideológicos mas também puramente técnicos. Nenhum dos Deputados possui a competência necessária para analisar absolutamente nada do que se propunham por lá. Resumindo essa viagem: um fiasco.

Agora vou entrar em um ponto mais delicado que pode chatear alguns amigos de Direita: devemos 'ignorar' a China? Não.

Poderíamos, mesmo se desejássemos? Também não, e vou até deixar de lado o ponto comercial mesmo porque há controvérsias sobre nossa “dependência”, como o Prof. Olavo de Carvalho já deixou bem claro, em muitos de seus posts. Apenas restrinjo-me falar da área que conheço mais especificamente: Inteligência Artificial (IA ou, em inglês, AI).

Vou contar uma coisa a vocês: ano passado tive o prazer de participar da primeira conferência sobre Tecnologias de Inteligência Artificial entre USA – China, que ocorreu no Silicon Valley em junho de 2018. Fui como convidada pela Empresa Austríaca a qual estava prestando serviços de consultoria e auditoria.

O evento foi patrocinado pelas seguintes entidades: AI Alliance of Silicon Valley, The Future Society e China's AI Industry Alliance (AIIA), a anfitriã do AI Forum na Wuzhen Summit.

O que aprendi?

Primeiro é que a China ultrapassará - oficialmente - os Estados Unidos nessa tecnologia e todas as suas aplicações já em 2020. Eles também dominam o suporte financeiro: em 2017, 48% do financiamento total de startups, empresas iniciantes, de IA em todo o mundo vieram da China, em comparação com 38% financiados pelos EUA e 13% pelo resto do mundo.
De uma forma mais prática, 85% das empresas chinesas são agentes ativos no campo da IA, liderando com folga diante dos outros Países do Mundo.

Entrando na polêmica de reconhecimento facial, não precisamos nem tocar na empresa Huawei: por exemplo, vocês sabiam que a Face++, uma startup chinesa de reconhecimento facial (e um dos alvos de investimentos da Sinovation), ganhou recentemente o primeiro lugar em três desafios de computação, à frente dos times da Microsoft, Facebook, Google e CMU?
Pois é, vocês encontrarão artigos específicos sobre isso na Forbes.

Na minha área de atuação, Big Data e Engenharia Social mais especificamente, a qual venho estudado a fundo com projetos de consultorias nas indústrias automotivas e financeiras: A China mantém a maior base de dados para análise e desenvolvimento de novas soluções.
Gostem ou não gostem, a maior parte das Empresas de maior relevância atual nessas linhas são chinesas.

O que isso tem a ver conosco? Tudo. Não há mais desenvolvimento possível sem considerar a introdução de IA no mercado.

Compliance? Precisamos dela (da technologia ). Big Data? Data Mining? GPRD, LGPD no Brasil em 2020? Precisamos dela. Ficaria aqui o dia inteiro citando áreas, mas considero ponto estabelecido.

Não é um exagero poético: Se quisermos fazer do Brasil realmente o País do Futuro, não há a menor possibilidade de ignorarmos ou “isolarmos” a China, pelo menos a curto prazo, onde talvez vejamos Israel e Estados Unidos como uma alternativa muito mais plausível e de igual ou maior potencial.

Agora: como fazer isso, ter uma aproximação tecnológica com a China de uma maneira correta, sem perigos e sem implicações a nossa sociedade? E o que daríamos em troca?

Não me atrevo a responder essas perguntas, todas acima da minha competência técnica, diplomática e intelectual, porém deixo um modesto comentário: creio que no momento uma reunião entre o Ministro Araújo Fraga, o Ministro Marcos Pontes e empresários conhecedores do assunto, como Winston Ling e, por que não, até nosso querido Professor Olavo de Carvalho, seriam muito mais capacitados a discutir essa questão com a responsabilidade e know-how que ela exige, do que um bando de Deputados deslumbrados.

Este é o meu parecer, como vejo tudo isso.

Stephanie Hansson é sueca/brasileira, profissional em engenhenharia social, IR, inteligência artificial, contra-inteligência e política.
Trabalhou como Engineering and Operations Director na empresa Ford Motor Company, Project Engineering Manager na empresa Pininfarina, Purchasing Program Leader na empresa Volvo Car Corporation


Uma outra visão – Walter Biancardine

Tive o prazer de ler este excelente texto, embasado e bem escrito e assim, gostaria de acrescentar alguns pontos para reflexão, que são os seguintes: moro em uma pequena cidade do interior do RJ, Cabo Frio, e ainda sem nenhuma razão plausível o prefeito local visitou - com numerosa corte - a China, semanas atrás. A alegação foi "incremento de acordos turísticos".

Pois bem, penso eu cá se a China - após a vitória e posse de Bolsonaro - mudou sua atenção ao Brasil, a ponto de convidar políticos desta maneira "atacadista", estendendo sua gentileza aos bisonhos novatos do PSL. Coincidência ou premeditação política?

Politicamente falando, estamos tratando de negociar com uma ditadura que contabiliza mais de 20 milhões de cadáveres locais desde seu advento; que é berço da Huawei - de triste reputação nos anais da espionagem mundial, com 4 diretores condenados e presos por este crime em 4 países ao redor do mundo - e igualmente financiadora da campanha eleitoral de Ciro Gomes - PDT, pertencente ao Foro de São Paulo.

Entendo a sinuca comercial que os sucessivos governos de esquerda brasileiros nos impuseram, desde FHC, nos forçando à verdadeira adicção comercial com este país; do mesmo modo sei que a saída não será à golpes de machado.

Entretanto os dados que acima mencionei evidenciam, pela sua dinâmica, a obviedade de intenso tráfego ilegal de informações de segurança nacional e ingerência política em nosso território. O que fazer? Submetermo-nos à fria razão dos números, escravos de uma balança comercial que nos rouba informações a troco de superavits? Ou entregarmo-nos á submissão, aprendizes de supostos beneficiários da tecnologia ambicionada e oferecida como atrativos, em troca de subserviência política, doutrinária e - perdoe - imperialista?

Sugiro que consideremos, em nossas análises, o fato de que não existe parto sem dor ou almoços grátis, a ruptura terá de ser feita em algum momento á despeito das "veladas" ameaças da Câmara de Comércio Brasil-China, que nos adverte da política chinesa de só "comerciar onde são bem vindos e que o sinal contrário pode ter consequências sérias".

Não há como derrotar algo ou alguém sem que tenhamos algo ou alguém para colocar em seu lugar.

Isto vale para o afastamento da China em prol dos USA e Israel e, igualmente, do funesto vermelho petista pelo verde e amarelo atual.

Walter Biancardine é jornalista e serviu a Organização dos Estados americanos (OEA) no Centro Interamericano de Comercialização CICOM – Proyecto 216 FGV/RJ, Consulado da Argentina/RJ
Igualmente foi o único servidor brasileiro da OEA na ECO-92 Earth Summit, que reuniu Chefes de Estado de todo o mundo no Rio de Janeiro.