O cantor Lobão
redigiu mais uma carta-pública endereçada a Chico Buarque, Gilberto
Gil e Caetano Veloso. No dia 27 de março, o músico publicou em sua
página do Facebook um pedido de desculpas "por ter sido,
durante todos esses anos, desonesto a diminuir o talento de vocês
três por pura birra, competição, autoafirmação ou até, vá lá,
uma discordância genuína quanto a princípios ideológicos,
políticos e metodológicos".
Já na nova carta,
Lobão critica a Lei Rouanet e o que chama de “era do artista
chapa-branca”. Em trecho direcionado a Chico Buarque, sugere que o
músico peça perdão ao público brasileiro por tê-lo traído com
os princípios que defende.
OPINIÃO – A
velocidade terrível da queda
Poucos artistas
podem se gabar de mudanças de opinião assumidas: é ponto de
honra que muitos se façam de deuses portadores da verdade divina e ,
portanto, imutável e perene.
Lobão mudou, e
assumiu esta mudança.
Em busca de suas
verdades (sim, pois todos temos as nossas, particulares) defendeu o
PT acreditando na faxina ética vendida pelos estelionatários. E,
como em todas as suas empreitadas, imprimiu devoção e dedicação
à mesma, chegando ao ponto de ser banido da Rede Globo por 8 anos ao
fazer propaganda do partido, no programa do Faustão.
Lobão acordou,
compreendeu que fora enganado e mudou.
Não defende
ditaduras – nem de esquerda, nem de direita. Não se refugia em
ideologias, luta apenas com as armas do intelecto e talento,
contra tudo e contra todos. E assume.
Não adere à
rótulos, só quer o fim da roubalheira, o desmascaramento desta
ditadura do consenso e o fim da glamourização do medíocre.
Lobão quer apenas o
bem; lutou e continua lutando por um Brasil melhor e agora não só
ele, mas todo o país, começa a colher os primeiros frutos da batalha.
O fim da
cleptocracia está próximo, eles irão cair.
Unamo-nos á Lobão e assistamos, de camarote, a velocidade terrível da queda.
Walter Biancardine
Há uma semana
escrevi uma carta aberta a vocês e, como já poderia prever, não
houve nenhum sinal significativo de resposta.
Saliento comovido
e contente o meigo e solitário depoimento de Gil ao aceitar as
minhas desculpas. Contudo, se Gil se dispusesse a ler o texto com
atenção constataria que o cerne da questão gira em torno de um
outro intento: uma convocação.
Chico deixou bem
claro que sequer se interessara em ler a mensagem quanto mais
respondê-la e Caetano adotou uma atitude evasiva eximindo-se de
qualquer manifestação a respeito.
Pois bem, apesar
desse comportamento um tanto lacônico por parte de vocês três, sou
forçado a constatar que a carta causou um forte impacto entre
oposicionistas, governistas, populares, isentões e intelectuais dos
mais variados sexos, feitios e tamanhos. Reações que variaram entre
o rejúbilo, o amor, a compreensão do meu gesto (era essa a minha
meta), e o repúdio, a indignação e o desprezo (para o meu
espanto!) sendo que nessa segunda categoria de reações
descontroladamente apaixonadas, expressaram seu veemente protesto,
tanto alguns muitos oposicionistas me criticando por ter "amarelado"
diante de "artistas vendidos", como governistas explodindo
de indignação por acharem o cúmulo dos cúmulos um nada como eu
pleitear uma conversa com o Olimpo "da nossa MPB”.
A que ponto
chegamos, não é verdade? Entretanto, nutrido pelos sinceros
sentimentos que me guiam somados a uma necessidade premente de
esclarecimentos e mudanças, não somente na mentalidade como também
nos desígnios políticos em que se enredou a nossa classe, retorno
ao teclado do computador para redigir-vos mais um insistente apelo.
Optarei, como
recurso didático e adequado para essa ocasião, adotar a abstrata
condição de nada. Portanto, a partir de agora, me apresentarei
assim: Muito prazer, meu nome é Nada.
Ser Nada muito me
convém para que meus motivos se ergam das névoas da dúvida. Ser o
Sub do Mundo é uma condição que muito me convém para ser mais bem
sucedido em mostrar a vocês três os absurdos, discrepâncias e
cacoetes comportamentais que doravante exporei.
Vou dividir meu
carinhoso pito em duas partes: a primeira caberá a Caetano e Gil, a
segunda a Chico. Prossigamos.
Querido Gil, você
ocupou o cargo de ministro da Cultura durante os oito anos da
administração Lula e prossegue, na administração Dilma com forte
penetração no ministério, pois o atual ministro Juca Ferreira é
homem de sua inteira confiança tendo atuado como seu subordinado no
tempo em que você foi o titular da pasta. Não sei se é apenas uma
estranha coincidência, mas foi exatamente durante todo esse período
que as perversidades e aberrações da Lei Rouanet começaram a
pulular em total descontrole. Foi aí inaugurada a era em que
artistas consagrados com grande nicho de público e mercado,
começaram a pautar seus eventos, shows, projetos, discos e DVD por
intermédio de subvenção de incentivos hospedados no bojo dessa lei
, transformando o mainstream cultural num antro de parasitas,
chapas-brancas e castrados de opiniões confiáveis.
Essa lei
proporcionou que a criação artística decrescesse a níveis
alarmantes, pois os tais editais dos quais se extrai a grana dos
medalhões privilegiam as enfadonhas comemorações de aniversários
de carreira, reuniões insólitas entre aristas improváveis,
homenagens pouco sinceras a astros falecidos, festas sem algum
sentido real de se comemorar e outras chicanas lamentáveis para
justificar o uso do dinheiro público.
Para piorar a
situação, como se isso só não bastasse, esse grupo de parasitas
passa a atuar como um grupo de ardentes defensores do governo. É a
Era do Artista Chapa-Branca. Uma era a ser esquecida.
Imagine você,
Gil, faça um exercício de alteridade e experimente o meu espanto em
saber um ministro da Cultura ter um camarote no carnaval de Bahia
subvencionado com uma grana possante da lei Rouanet! Isso,
definitivamente não é bonito. E para agravar a situação, é de se
prever que artistas periféricos sem a metade de seu talento se
estimulem e muito em se lambuzar nesse mesmo estilo sem o menor
prurido de consciência, não é mesmo?
Quanto a você,
Caetano, pilotando uma outra desastrosa escaramuça temos o Procure
Saber capitaneado por sua esposa, arregimentando algumas dezenas de
artistas a impor goela abaixo, a toque de caixa, uma lei absurda que
estatiza os direitos autorais aprovada com uma celeridade
inexplicável extraída dos parlamentares diante daquele decadente
espetáculo no Congresso Nacional protagonizado por nada mais nada
menos que Roberto Carlos cercado de uma plêiade de artistas
circunstantes. Roberto que aceitou ser anexado ao grupo em troca de
vossas presenças, Caetano Gil e Chico na defesa a censura das
biografias não autorizadas.
Isso também não
é bonito.
E o resultado
disso? Se vocês ainda não sabem, procurem saber! A lei que estatiza
os direitos autorais designando ao ministério da Cultura o controle
das entidades de arrecadação, provocou um decréscimo dramático na
arrecadação de mais de 350mil autores, compositores e músicos em
todo o Brasil. Sem falar das demissões em massa de funcionários no
ECAD e nas Associações de músicos e compositores.
Eu tenho aqui
comigo os dados e se vocês tiverem maior interesse, posso mostrá-los
com mais detalhes assim que vocês o desejarem.
E é como Nada
que me dirijo a vocês, como um anônimo entre esses autores e
músicos que tocam nos bares, botequins, churrascarias, quermesses,
puteiros e coretos, como par desses artistas que estão apartados de
grandes eventos, que não têm acesso a leis de incentivos, que não
são residentes de trilhas de novelas de grande emissoras, que não
contam com o beneplácito das editorias de cultura dos jornais... É
como um Nada amalgamado àqueles que não fazem parte de cortes de
subservientes a posar como um entorno cenográfico de coronéis da
canção que profiro um apelo angustiado: Seria plausível vocês
reverem suas posições quanto a essa lei de direitos autorais e nos
ajudar a revogá-la? Ainda é tempo. O STF está analisando nosso
pedido de revisão e o relator é o Ministro Fux. Seria lindo nos
aliarmos nesse momento de tamanha gravidade. Seria mais lindo ainda
derrubar a Lei Rouanet como vigora e tentarmos direcionar seus
benefícios àqueles que realmente dela precisam (Sou o Nada mas,
mesmo nessa hipótese continuaria
a não me incluir
como beneficiário).
Seria muito
triste vocês, que tanto fizeram pela música e a cultura
brasileiras, se resumissem, se reduzissem já entrados nos seus
setenta anos, como ícones de uma era vergonhosa, como defensores de
um governo execrável, incompetente, corrupto, criminoso. É disso
que estou falando. Ainda há tempo! Só o perdão liberta! Posso
dizer de coração, uma vez que vim a público vos pedir o meu. O
arrependimento lhes concederá uma verdadeira bênção, podem crer.
Chico, te deixei
por último, longe de ser o menos, pois hei de fazer aqui uma
ressalva em sua defesa por ter sabido através de uma amiga em comum
ser você contrário a utilizar pessoalmente da Lei Rouanet e
perceber, até onde posso conceber o que é justiça, não ser você
responsável por aparentados seus nem mesmo o diretor que fez um
filme sobre sua obra, todos estes, maiores de idade, serem
beneficiários dos incentivos da dita-cuja. Se isso realmente
procede, preciso dar-lhe meus parabéns "localizados".
Localizados sim,
pois gostaria muito de ampliá-los ao resto de sua conduta, no
entanto é na clave da tristeza e da angústia o diapasão que domina
todo o restante da minha mensagem.
Caro Chico, você
já tem 50 anos de vida pública, pelo menos. Com a sua inteligência
e talento é de assustar sua impermeabilidade diante da falência
absoluta de suas crenças ideológicas. E por isso mesmo, um exemplo
vivo do modelo do intelectual brasileiro a viver na infâmia da
delinquência intelectual.
Se todos nós
concordamos que toda a ditadura é algo injustificável, mais
injustificável ainda atacar uma ditadura defendendo outra e é
exatamente assim que você agiu no período da ditadura militar e vem
assim se jactando imune a dúvidas no transcorrer de todas essas
décadas.
Para deixar
escancarada a minha angústia, gostaria de invocar um Nelson
Rodrigues descendo do céu em que atualmente habita, com seu olhar
sampaco, suas bochechas ondulantes, com as mãos apoiadas nos
cotovelos a dirigir-lhe entre baforadas de Caporal Amarelinho uma
súplica daquelas, rodrigueanas... algo como: Chico Buarque, só o
perdão liberta! Encha de ar vossos pulmões e brade forte e alto
como jamais outrora ousara bradar dirigindo-se contrito ao povo
brasileiro: Povo brasileiro, me perdoe. Me perdoe por ignorar seu
descontentamento, suas desgraças e sua legitimidade em protestar
contra esse governo criminoso. Me perdoe por aviltá-lo chamando de
golpista toda uma nação genuinamente enfurecida.
Me perdoe povo
brasileiro por ser um charlatão em posar contra uma ditadura militar
e ser amigo durante todos esses anos de um dos maiores ditadores
genocidas da história, Fidel Castro.
Me perdoe, povo
brasileiro por defender o indefensável, por interferir com o meu
prestígio logrando a confiança que milhões de brasileiros
depositaram em meu chamado, por defender uma presidente que beira a
demência, por defender um psicopata que anseia se perpetuar no poder
através do crime, do suborno e da falcatrua. Me perdoe, povo
brasileiro por defender uma organização criminosa como nunca dantes
na história da humanidade ocorreu aqui em terras brasileiras e que é
dirigida pelo Foro de SP tendo como os irmãos Castro centro de todas
as ações criminosas perpetradas em toda América Latina. Me perdoe
por ser leniente com narco ditaduras como a Venezuela e a Bolívia,
com seus milhares de assassinatos e presos políticos, por esse
regime brega, retrógrado, autoritário e cafona que é o
bolivarianismo.
Me perdoe, povo
brasileiro por ser cúmplice de toda essa ignomínia, e por isso
mesmo, carregar minhas mãos respingadas com o sangue desses
incontáveis que tombaram sob o jugo de assassinos. Me perdoe, povo
brasileiro por ser eu, um mimado por uma corte de intelectuais
flácidos ao meu redor me tornando imune a qualquer drama de
consciência e insistir em subscrever um ideário comunista que tem
sob seu manto a opacidade dos medíocres, cujo o único brilho que
emana de seus anseios é o da inveja, da revanche e do ódio. Enfim,
povo brasileiro, me perdoe por te trair".
Desincorporando
Nelson e retornando a minha condição de Nada, de Sub-do-Mundo quero
terminar essa carta ressaltando mais uma vez esse momento terrível
que o Brasil está passando , as nossas responsabilidades diante
desse momento e de nossa boa vontade independente de quais lados nos
posicionemos, esperando que as linhas desse Nada que vos escreve
possam fazer alguma diferença (para melhor) nesse impasse a nos
envolver. E que elas tenham alguma chance real com a vossa
determinante ajuda, em contribuir para um Brasil mais adulto, mais
justo e mais unido.
Um forte abraço.
LOVE , LOVE , LOVE
Lobão (SP, 3 de
abril de 2016)