É ponto pacífico
que a Prefeitura não consegue – e nem conseguirá, sem a
compreensão dos servidores – integralizar o pagamento da folha até
o quinto dia útil, a menos que dinheiro externo entre nas contas do
município, tal como a reposição dos royalties. Assim sendo, por
diversas vezes conclamou o prefeito Alair Corrêa que o sindicato
compreendesse a situação; que pelo bem geral cessasse a greve e
pactuasse uma trégua até que as contas fossem regularizadas e os
recebimentos de salários, novamente pagos na data correta.
A intransigência
falou mais alto e a recusa permanece.
Todos os esforços –
no sentido de uma negociação política, que beneficiasse alunos,
pais e principalmente o ano letivo de 2015 – foram infrutíferos,
diante de uma renitência que só nos permite concluir que há, de
fato, uma motivação política no ato.
Tendo ultrapassado
todos os limites do bom senso, a greve imposta á sociedade pelo
SEPE/Lagos certamente não terá outro desfecho além da via
judicial.
A QUESTÃO LEGAL –
O QUE A LEI DETERMINA
No Supremo Tribunal
Federal, prevaleceu o entendimento de que a greve de servidores públicos só
seria juridicamente possível após a edição da lei
regulamentadora.
Essa posição
permaneceu inalterada até o ano de 2007, quando a Corte promoveu um
giro histórico na sua compreensão do instituto do Mandado de
Injunção. A Lei de Greve do setor privado (Lei 7.783/1989) passou a
vincular todas as greves de servidores públicos no país, até que o
Congresso Nacional aprove a lei específica reclamada pelo art. 37,
VII da Constituição.
O DESCONTO DOS DIAS
PARADOS.
A Lei n. 7.783/1989,
aplicável provisoriamente às greves no serviço público, trata do
enquadramento jurídico do período de paralisação nos seguintes
termos:
Art. 7º
Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em
greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações
obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo,
convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.
Parágrafo único.
É vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem
como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na
ocorrência das hipóteses previstas nos arts. 9º e 14.
Deste modo, o
período de greve é considerado como suspensão do contrato de
trabalho, donde se extrai que os dias parados, em princípio, não
são pagos.
A aplicação do
art. 7º aos servidores públicos estatutários exige ao menos duas
ressalvas:
a) a competência
para apreciar e julgar conflitos referentes a greves no serviço
público não é da Justiça do Trabalho, e sim da Justiça Comum,
como definiu o STF nos MI´s 670/ES, 708/DF e 712/PA;
b) não há
propriamente um contrato de trabalho entre o servidor estatutário e
a Administração Pública, mas sim uma relação de trabalho cujos
termos são definidos unilateralmente pelo Estado, através da edição
de leis em sentido formal.
De qualquer forma, o
art. 7º da Lei nº7.783/1989 tem sido utilizado como fundamento para
sustentar o não pagamento dos dias parados aos servidores em greve,
o que gera, porém, debates e polêmicas intermináveis na doutrina e
jurisprudência nacionais.
Ao se admitir a
greve no serviço público sem corte de ponto, haveria violação ao
princípio da isonomia, porquanto os trabalhadores da iniciativa
privada têm seus contratos de trabalho suspensos durante o período
da greve, como prevê o art. 7º da Lei nº 7.783/1989. Nas palavras
de Bezerra Leite, “é preciso que os trabalhadores públicos
brasileiros se conscientizem acerca da própria natureza instrumental
da greve e assumam os riscos que a deflagração do movimento lhes
impõe”
O jurista Álvares
da Silva caracteriza como “uma incoerência e um absurdo” que o
servidor público faça greve recebendo salário. Ao se referir às
greves que ocorriam antes da decisão do STF em 2007, o mencionado
autor afirma que “transferia-se totalmente para a sociedade o ônus
da paralisação e o servidor a praticava sem nenhum risco ou
consequência. Esta incoerência agora acabou”
Ao julgar os
Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/DF e 712/PA, o STF fixou
parâmetros que devem ser observados pelos tribunais, no julgamento
de litígios referentes a movimentos paredistas.
Conforme a Suprema
Corte, a greve provoca, em princípio, suspensão do contrato de
trabalho (e, por conseguinte, o não pagamento de salários), mas
esta premissa deve ser afastada nos casos em que a greve foi
provocada pelo atraso no pagamento dos servidores, ou por situação
“excepcional” similar.
Assim sendo, a
questão do pagamento pelos dias parados deve ser resolvida conforme
as particularidades de cada caso concreto, havendo nuances que não
podem ser desconsideradas.
O CASO DO SEPE
Este é justamente o
ponto onde devemos situar a greve do SEPE perante os atrasos
salariais: os atrasos – ponto principal do movimento – não foram
provocados por má gestão, perseguição ou descaso e caberá á
Justiça decidir – diante das várias correntes que preconizam o
não pagamento ou a integralização dos vencimentos – o que
acontecerá com os bolsos dos professores grevistas.
Diante de uma
inegável situação de calamidade financeira, pública e notória,
que abrange não apenas os âmbitos municipais e estaduais como
alcança inclusive a esfera Federal, haverá a Justiça de considerar
a causa como absolutamente alheia à vontade da Prefeitura de Cabo
Frio. Em nenhum momento a prefeitura pretendeu eximir-se da obrigação
de pagar; do mesmo modo obedeceu – com os atrasos que motivaram o
movimento – esta obrigação, efetuando verdadeiros
“contorcionismos” financeiros para jamais deixar de cumpri-la.
Devemos levar em
conta também os gestos de boa vontade, levados a público pela
Prefeitura, que não apenas ofereceu ao Sindicato a gestão dos
recursos provenientes do FUNDEB como igualmente, por mais de duas
vezes, conclamou a categoria ao entendimento e negociação –
inclusive intermediado pela Câmara de Vereadores – mas sem que
houvesse aceite da tal gestão nem flexibilização de
reivindicações, por parte do SEPE.
A Prefeitura de Cabo
Frio, segundo o apurado pelo Opinião, não contesta nem pretende ver
revogada a obrigatoriedade do pagamento até o quinto dia útil de
cada mês, apenas conclama a categoria para que compreendam a
situação emergencial a qual atravessa o município – com causas
públicas e notórias – para que, por intervalo de tempo a ser
combinado entre as partes, abram mão provisoriamente deste direito
em favor da regularização geral da folha de pagamentos de todo o
corpo de servidores municipais, igualmente afetados pela crise
causadora dos transtornos.
Persistindo em tal
intransigência, dilapidam suas reputações perante a opinião de
pais e alunos, bem como diante de toda a sociedade cabofriense e não
deixam outra saída que não a Justiça.
Que seja feita.
Walter Biancardine